quinta-feira, 18 de março de 2010

IUPERJ: desafio e crise

Gilberto Velho*

Já há vários anos o IUPERJ (Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro), vinculado à UCAM (Universidade Cândido Mendes), vive um clima de insegurança institucional com repercussões que extrapolam a própria instituição. Isso se deve a sua importância e papel crucial nas ciências sociais brasileiras como um todo. Há mais de quarenta anos contribui, através de uma produção rica e diversificada, para o desenvolvimento da sociologia e da ciência política em nosso país. Sempre abrigou profissionais de diferentes perspectivas e orientações. Sua vida nem sempre foi pacífica, mas destacou-se pela contribuição acadêmica e política para o fortalecimento da área de pesquisa e ensino das ciências sociais.


O Brasil tem um sério problema de quadros que afeta gravemente suas possibilidades de desenvolvimento e consolidação democrática. O trabalho realizado no IUPERJ não só formou profissionais de excelente nível que atuam dentro e fora do país mas, também, foi, desde o seu início, um centro de debates sobre questões científicas e, relacionados a elas, sobre os problemas dos mais variados níveis da sociedade nacional. Não se limitou às fronteiras brasileiras mas, de vários modos, abriu espaço para uma perspectiva comparativa com outras sociedades de diversos lugares do mundo. A atuação de seus professores e alunos em congressos, seminários e encontros nacionais e internacionais lhe deu uma marca cosmopolita que poucas instituições podem ostentar. Entre outros pontos, há que destacar o forte papel desempenhado pelos iuperjianos na criação e consolidação da ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais), foco irradiador dos melhores padrões na área de ciências sociais. O IUPERJ vive uma situação frágil e ambígua em termos financeiros e institucionais. Várias soluções têm sido buscadas e esforços despendidos para encontrar saídas que lhe garantam estabilidade mínima que permita a manutenção de suas múltiplas e importantes atividades. Infelizmente, estamos vivendo um momento crítico, talvez o mais grave desde a sua fundação, quando o temor do fim da instituição assume contornos reais ameaçadores.


Como já disse, num país que tem problemas de quadros e com dificuldades de lidar com questões que prejudicam drasticamente a qualidade de vida de sua população, a orientação institucional do IUPERJ, com suas características múltiplas, faria uma falta de impacto incomensurável. As ameaças que pairam sob a instituição já são danosas, afetando os corpos docente e discente, além de seus quadros técnico-administrativos.


O Brasil já perdeu, na área das ciências sociais, instituições importantes, como o ISEB (Instituto Superior de Estudos Brasileiros) e o CLAPCS (Centro Latino-Americano de Pesquisas em Ciências Sociais). O primeiro caso foi decorrência da instauração do regime militar e o segundo produto de dificuldades administrativas e legais. É sempre doloroso lembrar o que significou a destruição da biblioteca do CLAPCS, a melhor do Brasil em estudos latino-americanos naquela época. É assustador pensar que algo semelhante possa acontecer com o patrimônio representado pelo IUPERJ. O que acontecerá com o seu pessoal, de todas as categorias, sua biblioteca, seus acervos de pesquisa, seus arquivos, documentação, e tudo mais que ali existe? Em vários planos essa ameaça é assustadora. Em termos brasileiros, em geral, representaria uma perda irreparável. Para o Rio de Janeiro, especificamente, seria mais um golpe de amesquinhamento e empobrecimento de suas instituições culturais. A comunidade científica, como um todo, através dos outros programas e instituições, de suas sociedades, como a ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais), a ABA (Associação Brasileira de Antropologia), as sociedades de Sociologia e Ciência Política, a SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e a ABC (Academia Brasileira de Ciências), precisa manter-se em permanente vigilância em defesa da sobrevivência do IUPERJ nas melhores condições que puderem ser encontradas.


Para superar essa grave crise, continua-se dependendo do Governo Federal e dos Ministérios e agências responsáveis pelas áreas de ciência, cultura, educação e tecnologia. É absolutamente necessário que sejam vencidos os obstáculos burocráticos e jurídicos que dificultam uma saída honrosa que, efetivamente, seja um marco na luta em defesa dos melhores valores acadêmicos, humanistas e democráticos no nosso país.






*Professor Titular e Decano do Departamento de Antropologia do Museu Nacional / UFRJ
Membro da Academia Brasileira de Ciências