terça-feira, 6 de outubro de 2009

PATRIMÔNIO, GUERRA E ABANDONO

Gilberto Velho*

As notícias trágicas sobre morticínio e devastação no Iraque são agravadas pela destruição de seu patrimônio cultural. O saque do Museu de Bagdá, o incêndio da Biblioteca Nacional e a devastação de tesouros históricos e arqueológicos aprofunda o drama de violência e desrespeito. Não se trata de defender, obviamente, o regime derrotado mas de denunciar as atrocidades de todos os tipos desencadeadas com a invasão anglo-americana. O patrimônio cultural de uma nação é parte fundamental e constitutiva de sua identidade, âncora de sua memória, base para os seus projetos e sua contribuição para a humanidade.
De outro modo, mas igualmente dramática, é a situação de abandono e desprezo em que está o patrimônio cultural brasileiro. O recente incêndio em Ouro Preto é um elemento a mais no quadro do descaso que afeta todo o país, incluindo cidades como Rio de Janeiro e Salvador, fontes permanentes de más notícias.
Dentro dessa situação geral de carência, a crise do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) é das piores diante da riqueza de seu patrimônio cultural e científico. A importância de seu prédio, de suas coleções, de suas atividades científicas e de ensino exigiriam uma ação coordenada pelo governo federal, envolvendo as áreas de educação, cultura e ciência e tecnologia. Antes de tudo é preciso protegê-lo de propostas demagógicas e apoiar vigorosamente seus diversos projetos relevantes para o país.
Outro caso lamentável é o do Instituto Nacional do Folclore do Ministério da Cultura, particularmente massacrado no governo Collor e vítima constante de diagnósticos e medidas tecnocráticas que ignoram a sua importância para a defesa e estudo das culturas tradicionais e populares de nosso país. Espera-se do atual governo brasileiro perspectivas e ações para a área cultural condizentes com seus programas e intenções anunciados.
Num mundo conturbado e violento, urge um esforço forte e contínuo em defesa do patrimônio cultural que deve ser um dos eixos para a constituição de uma sociedade mais íntegra e harmoniosa.


*Antropólogo
PUBLICADO EM O GLOBO, 23/04/2003.

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